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segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Do dever da escola ao genitor não guardião


Missão



Promover o alcance ao direito de proteção integral à criança, ao adolescente e ao idoso expostos aos conflitos familiares, através da promoção do conhecimento e desenvolvimento da sociedade.

Do dever da escola ao genitor não guardião



Melissa Telles Barufi[1]
Laura Affonso da Costa Levy[2]
1. Introdução
É cediço o dever das escolas em garantir o pleno acesso e disponibilizar os dados aos genitores das crianças independentemente do vínculo da conjugalidade. Todavia, corriqueiramente, escritórios de advocacia que atuam na área familista se deparam com repetidos casos em que as instituições de ensino insistem em praticar condutas contrárias a esta ordem.
Desta forma, necessário se faz abordar o tema do amplo dever de informação das escolas para com os pais, passando pela análise legislativa que ampara este dever e os princípios constitucionais que permeiam a matéria, agrupados no Princípio do Melhor Interesse.
2. O poder parental
A tradicional expressão “Pátrio Poder” foi cedendo lugar a novas denominações, como: poder parental e poder de proteção. Este poder deve ser exercido no superior interesse do menor, deixando de ser um poder para se tornar um dever, uma responsabilidade.
Assim, o poder parental, é um conjunto incindível de poderes-deveres, que deve ser altruisticamente exercido à vista do integral desenvolvimento dos filhos, até que esses se bastem em si mesmos. Sendo pai e mãe conjunta, igualitária e simultaneamente, os sujeitos ativos do exercício do poder parental, como efeito da paternidade e da maternidade e não do matrimônio ou da união estável.
A partir da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (1989), a questão do interesse da criança em conservar relações pessoais com ambos os pais passa a ser reconhecida como direito.
A nova Lei Civil trouxe, de forma clara, ao pai e à mãe o exercício conjunto do poder familiar, em seus artigos 1.631 e 1.634, que antes só se encontrava um respaldo no Estatuto da Criança e do Adolescente, assegurando aos pais, na separação judicial, no divórcio e na dissolução da união estável, terem seus filhos em sua companhia.
Desta sorte, o poder familiar não se confunde com a guarda, e tampouco é afetado pela separação, divórcio ou dissolução da convivência dos pais. Este instituto tem sua origem na razão natural dos filhos necessitarem de cuidado, com a absoluta dependência desde seu nascimento e reduzindo esta na medida de seu crescimento, desligando-se os filhos da potestade dos pais quando atingem a capacidade cronológica com a maioridade civil, ou através da sua emancipação.
O artigo 229 da Constituição Federal mostra o conteúdo do poder familiar, ao prescrever como deveres inerentes aos pais os de assistir, criar e educar os filhos menores, sendo secundado pelo artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente, quando estabelece ser incumbência dos pais o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores.
3. A guarda material e a guarda jurídica: suas distinções
Após a ruptura conjugal há um desdobramento da guarda. Tal desdobramento enfraquece de certa forma o poder familiar do genitor que fica impedido do amplo exercício do seu direito, com a mesma intensidade e na mesma medida que o outro, o guardador.
Aquele dos genitores a quem é atribuída a guarda, como observa Orlando Gomes tem-na não apenas a material, mas também a jurídica. A primeira consiste em ter o filho em companhia, vivendo com ele sob o mesmo teto, em exercício de posse e vigilância. A segunda implica o direito de reger a pessoa dos filhos, dirigindo-lhe a educação e decidindo todas as questões do interesse superior dele, cabendo ao outro o direito e dever de fiscalizar as deliberações tomadas pelo genitor a quem a guarda foi atribuída.[3]
Assim, a guarda jurídica é exercida a distância pelo genitor não-guardião. A guarda material, ou física, prevista no artigo 33, § 1º, do ECA realiza-se pela proximidade diária do genitor que conviva com o filho.
A ruptura conjugal cria a família monoparental e a autoridade parental, até então exercida pelo pai e pela mãe, acompanha a crise e se concentra em um só dos genitores, ficando o outro muitas vezes reduzido a um papel verdadeiramente secundário (visita, alimentos, fiscalização). Quer isso dizer que um dos genitores exerce a guarda no âmbito da atuação prática, no cuidado diário e outro conserva as faculdades potenciais de atuação.
Assim, surgem os conflitos em relação à guarda de filhos de pais que não mais convivem. Cumpre ao legislador e ao Judiciário o dever de estabelecer as soluções que privilegiem a manutenção dos laços, eliminando a dissimetria dos papéis parentais.
Portanto, o fato do genitor não possuir a guarda do filho, não resta prejudicado para exercer o poder familiar que, inclusive, deixando de fazer estará praticando crime tipificado no Código Penal, como: abandono material, artigo 244; abandono intelectual artigo 245; abandono moral artigo 247; abandono de incapaz artigo. 133; abandono de recém nascido artigo. 134.
4. Do melhor interesse
A partir da Constituição de 1988, o Brasil passa a ser signatário da Doutrina da Proteção Integral. A criança, antes sujeito de necessidades, adquire a condição de sujeito de direitos. Neste sentido, vistos como detentores de dignidade subjetiva merecendo especial atenção a fim de efetivamente receber proteção e reconhecimento como “Sujeito de Direitos” de“Prioridade Absoluta”.
A respeito desses direitos fundamentais, o Estatuto traz consubstanciado no art. 4º, 7º e no caput do art. 19 o direito à vida, saúde e convivência familiar e comunitária.
5. Do dever de informação das Instituições de Ensino
Em 2009 foi promulgada a Lei 12.013, que alterou o art. 12 da Lei de Diretrizes e Bases, garantindo o direito de pais, conviventes ou não com seus filhos, receberem informações quanto a freqüência e rendimentos dos alunos, bem como sobre a execução da proposta pedagógica da escola.
Assim, assegurar ao pai não-guardião o acesso às informações escolares do filho é, antes de tudo, um direito da criança e do adolescente a garantir-lhe o desenvolvimento e preparo para o exercício da cidadania.
Os diretores das escolas que não compartilham e até proíbem o acesso às informações acerca do rendimento escolar, dia e horário de reuniões, festas comemorativas e senhas de acesso a páginas eletrônicas que constam dados do aluno, estão demonstrando confusão entre os institutos da guarda e poder familiar anteriormente abordados, além do descumprimento de ordem legal.
Desta forma, pela falta de conhecimento da legislação vigente e insensibilidade, as escolas brasileiras seguem descumprindo com o preceito maior de proteção e atenção às crianças e adolescentes. Com a alteração trazida pela Lei 12.013 de 2009, as instituições estão obrigadas a fornecer informações escolares aos pais, conviventes ou não com seus filhos. Desta maneira, deveriam se posicionar a fim de contribuir para que os filhos tenham seus genitores mais próximos, em consonância com a política da paternidade responsável e garantindo o direito de convivência familiar saudável.
A escola deve ser um instrumento de efetivação de desenvolvimento sadio, oferecendo a cada um dos pais o espaço para fazer parte da escola, compartilhar e dialogar nas tomadas de decisões.
De nada nos adianta lei esquecida ou desviada do seu propósito. Conforme elucida Marcos Duarte,
Ressalta-se que, apesar de toda a preocupação em se positivar direitos relativos aos menores de idade, o que se observa na prática é a constante violação desses direitos, estando ainda essa classe da população sofrendo frontais discriminações. O Brasil, (...) em que pese possuir leis internacionais e ser signatário de todos os tratados internacionais de proteção à criança, ainda se encontra distante de, na prática, atribuir às suas crianças a qualidade de sujeitos de direito.[4]
6. Conclusão
As transformações, os questionamentos, as direções por que passam a sociedade obrigam os profissionais, instituições e grupos sociais a pesquisar, discutir, orientar-se e atualizar-se quanto aos aspectos sociais, jurídicos, psicológicos e institucionais dessas mudanças. Os ordenamentos jurídicos devem refletir a realidade social e corresponder o melhor possível às necessidades e demandas que essa sociedade impõe. Resta-nos efetivar estes direitos e possibilitar o concreto desenvolvimento da criança e adolescente.
7. Referências
DUARTE, Marcos. Alienação Parental: restituição internacional de crianças e abuso do direito de guarda. Leis & letras, 2010.

GOMES, Orlando. Direito de família. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981.

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[1] Advogada familista do escritório Telles e Dala Nora advogados, especializada em Direito de família e sucessões, palestrante convidada da Escola Superior de Advocacia do Estado do Rio Grande do Sul.
[2] Advogada; Mestranda em Aspectos Bioéticos e Jurídicos pela UMSA - Universidad del Museo Social Argentino; Especialista em Bioética pela PUC/RS, Especialista em Direito Civil - ênfase em Direito de Família e Sucessões, pela Faculdade IDC. Membro da Sociedade Rio-Grandense de Bioética SORBI. Membro do Núcleo de Estudos de Bioética da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul AJURIS; Parecerista e Consultora Jurídica.
[3] GOMES, Orlando. Direito de família. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p. 281.
[4] DUARTE, Marcos. Alienação Parental: restituição internacional de crianças e abuso do direito de guarda. Leis & Letras, 2010.

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