E disse-lhe um da multidão: Mestre, dize a meu irmão que reparta comigo
a herança.
Mas ele lhe disse: Homem, quem me pôs a mim por juiz ou repartidor
entre vós?
E disse-lhes: Acautelai-vos e guardai-vos da avareza; porque a vida de
qualquer não consiste na abundância do que possui.
(Lucas 12:13-15)
Nada é tão inexorável como a
certeza da morte. Ela sempre foi a grande preocupação do ser humano e também o
grande mistério da vida. No entanto esse tema é evitado, cercado de tabus e
medos. Pensa-se muito mais do que se fala a respeito dela. No entanto, no aspecto
patrimonial, a morte deve ser planejada. Ou seja, considerando seu evento certo
e derradeiro, porque não facilitar as coisas para sua família, herdeiros
naturais, na questão da proteção patrimonial?
A realidade acerca dos processos
de inventário retrata o lado materialista dos seres humanos. O direito
hereditário não foi esquecido no rol dos direitos fundamentais previstos na Constituição
Brasileira, porém, a legislação ordinária presente no Código Civil Brasileiro,
encarregou-se de tornar mais complexo e dificultoso aquilo que já detinha essa
qualidade, eis que ao alterar as regras jurídicas a respeito, incorreu em erros
grosseiros e omissões que, desde o ano de 2002, vem atormentando os operadores
jurídicos e retardando ainda mais a tramitação dos processos de inventário.
E o panorama futuro não é
promissor... a transmissão hereditária tem sido alvo de propostas para
maior tributação, já havendo sugestões de índices como de 40% sobre o montante
hereditário. Mais ainda, com base na
autonomia e liberdade patrimonial, já ocorrem manifestações acerca da extinção
do direito da legítima, ou seja, da parte indisponível do patrimônio reservada
aos chamados herdeiros necessários, a
saber, descendentes, ascendentes ou cônjuge. Em outras palavras, a liberdade
absoluta de testar tem sido defendida por importantes doutrinadores do
tema. Ate mesmo a defesa absoluta da própria extinção do direito sucessório tem
sido mencionada em encontros dos profissionais da área.
E não é difícil de compreender a
causa de tal tendência. Quem trabalha com o Direito Sucessório, conhece os
inúmeros processos que demandam custos, tempo,
dedicação dos lidadores do direito, volumes processuais que materialmente
ostentam sua antiguidade e manuseio, retratando
o litígio familiar, muitas vezes de década, e que resultam em perdas
financeiras, afetivas, de saúde e, muitas vezes de vidas humanas.
O hereditando não mais esta nesse
mundo para acompanhar tais conflitos, porém integra e vivencia esse drama não somente
aquela primeira ordem de herdeiros que desencadeou o litígio, mas todos os demais que lhes
descendem, muitas vezes gerações inteiras que desconhecem a harmonia familiar,
eis que já nasceram dentro do conflito, que unicamente tem um intuito
patrimonial.
Existem formas para evitar tais
fatos, no que chamamos de planejamento
sucessório. Esse pode ser na modalidade de testamento, codicilos, criação
de holding familiar, pactos
antenupciais, contratos de convivências, alteração de regime de bens... Cada situação
deve ser analisada separadamente, a fim de que seja escolhida a modalidade mais
adequada.
De qualquer forma, o melhor seria
não deixar herança. Existem outras formas de proteger os familiares: doações em
vida, adiantamento de legitima, previdência privada, seguro de vida, enfim,
hoje a herança patrimonial não tem a mais a conotação de antigamente. Tudo deve
ser considerado e planejado, a fim de que, depois de refletir sobre tema tão
dificultoso, o proprietário dos bens possa efetivamente viver e,
despreocupadamente, usufruir daquilo que conseguiu para si, fruto de seu próprio
esforço. certo que, sua história, seu nome, sua família, não sejam objeto de mais um de tantos processos que
abarrotam os cartórios judiciais, e que parecem tristemente retratar o fracasso
de uma relação que deveria ser simplesmente recheada de afetos.