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quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Época de monografias...


PLÁGIO E A COMPRA DE MONOGRAFIA TRABALHOS ESCOLARES
Autor: Hugo Lovisolo
Nas paredes das universidades e nas páginas da Internet proliferam os anúncios dos fazedores de trabalhos, geralmente monografias de graduação e de pós-graduação (especialização e MBA), dissertações e teses. Assinar um trabalho feito por outro, encomendado e pago ou diretamente plagiado, é cometer vários delitos previstos pela legislação.
A ordem legal penaliza tal tipo de ação. Mais significativo ainda é o fato de ferir a moral social vigente no campo intelectual e universitário. Surgem duas questões relevantes e entremeadas: quais as razões ou motivos para essas condutas ilegais e imorais e quais são as condições que favorecem essa emergência?
Sob o ponto de vista tradicional da moral intelectual e universitária, o trabalho final é considerado a culminação de um processo de formação, um momento de articulação e sistematização próprio, pessoal e original. A realização do trabalho final implica considerarmos a carreira universitária como um desafio que apresenta obstáculos que devem ser superados, sendo o trabalho final altamente valorizado neste sentido. Destaquemos: é sobretudo um momento de posta a prova da capacidade pessoal e de realização. Espera-se que o autor sinta orgulho por aquilo que fez. Daí decorre a necessidade dos rituais de defesa, não raro, com a presença de parentes e amigos e os agradecimentos àqueles que ajudaram na superação dos obstáculos da carreira.
Creio que esse sentido moral está perdendo sua força motivadora. Creio que o trabalho final está adquirindo apenas o sentido de um requisito que deve ser preenchido com o menor custo possível. Digamos que se está tornando, para uma parcela dos estudantes, cujo tamanho é difícil de estimar, apenas mais um degrau burocrático na obtenção da titulação. Diante deste novo cenário de sentidos, porque não pagar a outro para que eu suba o degrau? O mero fato dos alunos se perguntar sobre tal possibilidade já é a ponta do iceberg do funcionamento universitário.
Faz várias décadas domina no campo da formação universitária os discursos utilitaristas. Embora com nuanças e desdobramentos, seu núcleo comum afirma que a Universidade deve estar a serviço da sociedade. A forma mais importante de cumprir com esse dever é mediante a formação de profissionais para o mercado. Um efeito desta moralidade é a multiplicação dos cursos, cada um dos quais se apresenta como adequado para um nicho de demanda ocupacional ou, de modo mais geral, para a dinâmica do mercado de trabalho
Sou da opinião de que, e talvez apesar de suas boas intenções, a moral utilitarista acaba promovendo o entendimento da formação, e de sua testemunha, o diploma, como um instrumento ou recurso para o mercado de trabalho.
Diante da força do utilitarismo, a moral tradicional da formação para a verdade e para a cultura desaparece, apesar da aparente valorização dos produtos culturais e da diferencia cultural. Sem contrapesos explícitos e atuantes, o entendimento da moral utilitarista leva a aplicar fórmulas de custo benefício na procura e realização dos cursos universitários. A carreira universitária deixa de ser uma finalidade, torna-se um meio para o mercado, como o dinheiro é um meio para comprar uma casa ou um carro.
Assim, qualquer recurso que signifique redução de custos ou de esforços, na obtenção da titulação, pode ser escolhido e usado. Realizar o curso no menor tempo, e se possível trabalhando, torna-se um objetivo dominante. Não perder o tempo participando de eventos que não dão certificações ou não estão diretamente relacionados com a profissão torna-se uma regra. Fazer o maior número de disciplinas no menor tempo possível vira outra regra. Os exemplos poderiam ser multiplicados, o que importa destacar é que dentro da lógica utilitária pagar pela monografia de fim de curso torna-se racional.
Os motivos para agirmos interagem com as condições que podem favorecer ou não que tentemos sua realização. De modo geral, as condições de funcionamento do ensino superior no Brasil favorecem os motivos orientadores da moral utilitária, gerando situações e significados que a reforçam, que a tornam dominante.
Sem pretender esgotar a lista das condições me referirei a alguns deles e a suas implicações ou efeitos. Creio que ainda não avaliamos suficientemente os custos que provoca o modo de seleção universitária dominante. Exigimos dos jovens que saibam que curso pretende fazer e a eles se candidatem.
Supomos o absurdo de que o jovem tenha consciência tanto do perfil dinâmico de suas vocações quanto do perfil de mercado que deverá enfrentar adiante. Desta forma, o curso, e não a vida universitária, ocupa o lugar central. Eu insisto, se entra no curso e não na universidade. Os erros de escolha se multiplicam e as altas taxas de abandono, de novos vestibulares e novas escolhas, podem ser parcialmente explicadas por tal modo de funcionamento.
A ineficiência em reter o aluno, no contexto do país pobre, aumenta a pobreza. Importa sobretudo destacar que estamos obrigando o candidato a pensar utilitariamente, ou seja, sob o ponto de vista de sua inserção no mercado e dos custos, objetivos e subjetivos, da escolha do curso.
Centrado no curso, o aluno terá poucas oportunidades de pensar os significados da vida universitária e, muitas menos, de explorar criativamente sua diversidade. Criamos o cativeiro do curso e a resposta imediatista válida passa a ser a de sair dele o mais rapidamente possível.
A continuação, o aluno deverá enfrentar um curso de alta carga horária distribuída em 20 ou mais horas de aulas por semana e fragmentadas em cinco ou mais disciplinas. Se considerarmos que por cada hora de aula os alunos deveriam dedicar duas horas para seus estudos, estamos diante de um sistema que exige de um jovem 60 horas de dedicação semanal ao curso. Tal exigência se adapta pouco ao estilo de vida dos jovens.
A resposta é a malandragem: a falta no limite permitido, a escolha de professores pouco exigentes, a pressão por remover os professores exigentes-especialmente no ensino privado--, o baixo tempo dedicado ao trabalho pessoal e em grupo, o pouco tempo dedicado à leitura, reflexão e a realização de exercícios, a baixa ou nula participação nas atividades da vida universitária, entre outras formas de adaptação. O aluno se torna uma máquina utilitária de minimizar os esforços para sair rapidamente do curso.
Os alunos universitários sofrem de ansiedade de conclusão. Pior ainda, uma parcela significativa dos alunos concluirá o curso tendo enormes dificuldades para realizar uma monografia, daí a sua compra há apenas um passo, ou de aprovar exames como os da OAB, cujas altas taxas de reprovação são noticiadas pela mídia.
A democratização do ensino superior, a tremenda expansão da matrícula dos últimos anos, também é uma condição favorável. A democratização é um bem, nada tem de errado. O erro está em que ao invés de criarmos formas adaptadas a essa nova condição, continuamos operando como se o ensino superior funcionasse de forma altamente seletiva, o que ocorre em um pequeno grupo de universidades públicas e comunitárias.
A democratização aumentou a demanda de professores que passaram a ter varias inserções e cada vez mais alunos. O conhecimento do aluno pelo professor decai tanto na graduação como na especialização em sentido lato, sendo o caso extremo a situação dos professores viajantes dos MBAs.
O desconhecimento do aluno favorece a cópia e a compra do trabalho final. Pior ainda, dedicada a dar aulas, não raro repetindo os mesmos conteúdos ou disciplinas, parcela significativa dos professores tornam-se muito semelhantes aos seus alunos: deixam de ler, estudar e participar da vida universitária. Sem condições, perdem a capacidade, e talvez até o interesse, de detectar os erros e as fraudes dos trabalhos. Fazer que o aluno melhore ou faça outro trabalho significa mais esforço do docente.
A compra e o plágio do trabalho é a ponta do iceberg. Erraremos muito se pensarmos que resulta da internet ou da conduta ilegal dos que pretendem ganhar dinheiro. Se não repensarmos a universidade teremos, talvez, a compra da nota e no final, de forma dissimulada, a própria compra do diploma.
Hugo Lovisolo é Doutor em Antropologia Social. Coordenador Geral de Pesquisa e Pós-graduação da UGF

fonte- www.trabalhos.prontos.escolares.com

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