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quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Em nome dos pais e dos filhos.



As notícias de violência física contra crianças sempre provocam indignação e repulsa na sociedade em geral. Porém, dentro da intimidade dos lares, de forma velada e quase imperceptível, outra espécie de violência é praticada e se difunde rapidamente. Sem estar relacionada como crime, porém apresentando danos talvez mais danosos do que muitos dos que são tipificados pelo Código Penal: a violência moral, denominada como Alienação Parental que vitimiza o mais íntimo e sensível vínculo do ser humano: as relações de filiação.
Tal violência normalmente é praticada pela pessoa que mais deveria se preocupar com a preservação de tal vínculo: o genitor guardião. As vítimas diretas são os filhos, usados como instrumento de agressão às outras vítimas dessa prática: os genitores não guardiões. Assim, a prática da alienação parental encontra terreno fértil nas situações de guarda unilateral que, infelizmente, constituem-se na esmagadora maioria das decisões e acordos nas dissoluções de sociedades conjugais.
Nos últimos tempos têm aumentado a divulgação dessa prática e o seu combate tem sido acirrado especialmente pelas redes sociais. Grupos de pais denunciam essa violência e divulgam suas experiências buscando chamar a atenção dos legisladores e dos operadores de direito sobre a questão. Nessa luta denunciam a reiterada opção da guarda unilateral nas decisões judiciais, eis que certamente é a organização mais cômoda e atende aos preceitos costumeiros e culturais. Nessa ofensiva apontam especialmente as mulheres como alienadoras e, inclusive, acusam os advogados que atuam na área, como omissos na luta por outra forma de organização da questão. A justificativa para essa omissão seria a de que o litígio nos casos da guarda unilateral é mais acirrado, eis que questões como regulamentação de visitas, revisão e cobrança de alimentos, além da própria alteração de guarda, seriam conseqüências comuns e lógicas em tais casos, gerando, assim, maior fonte de renda e ganhos aos profissionais da área.
A acusação dos pais, vítimas de alienação parental, talvez não seja tão injusta assim. Nós, advogados na área de Direito de Família, bem como juízes, promotores e todos aqueles que se envolvem com as questões atinentes à matéria, devemos nos conscientizar de que também somos responsáveis pela proteção às crianças e aos adolescentes. Assim, menosprezando tal problema, na verdade estamos abrindo caminho ao conflito acirrado que atinge a mais importante das instituições sociais: a própria família. Conseqüentemente, estamos agredindo e violentando os membros que a integram, afetando a sua saúde mental.
O legislador brasileiro já havia buscado uma alternativa apontada pelos especialistas como meio de prevenção à alienação parental e, conseqüentemente, ao abandono afetivo: a guarda compartilhada. O artigo 1.583, parágrafo 2º do Código Civil, determina que a guarda compartilhada será aplicada pelo juiz, na ausência de acordo, sempre que possível. Tal regramento, porém, é inócuo, eis que essa opção raramente é escolhida pelos genitores, e os juízes só a definem caso haja consenso entre o casal. Pois bem, nova tentativa será feita, através do legislativo. No próximo dia 28 de outubro será votado no Senado Federal o Projeto de Lei 117/2013, que determina que a guarda compartilhada dos filhos seja obrigatória, desde que o pai e a mãe tenham condições de criá-los e que tenham interesse na guarda dos mesmos, tornando-se assim, de forma expressa a modalidade unilateral apenas como exceção.
É importante entender que, mais do que simplesmente definir-se essa forma de guarda conjunta, ainda será necessária a sua organização concreta. Isso deverá ser feito considerando-se cada caso concreto, eis que guarda compartilhada não se confunde com visitação livre.
Para tanto, além dos pais e da família extensa envolvida na questão, outras pessoas devem exercer papel efetivo na busca dessa transformação. Os juízes, que não podem se eximir de sua autoridade no caso de litígio; o promotor, que irá acompanhar o processo com a finalidade protetiva que lhe é inerente; os advogados, que devem ter em mente que o exercício da advocacia, na área de família, não pode ser combativo e sim conciliador: os educadores e demais participantes da rotina das crianças e adolescentes devem ser envolver e respeitar o processo de adequação familiar.
Se a entidade familiar se desajustou como sociedade conjugal, o vínculo de filiação é indissolúvel, e deve ser respeitado e preservado, sob pena de se desestabilizar o mais importante de todos os vínculos humanos: a relação entre pais e filhos.

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