Observando casais com bebês recém-nascidos
ou por chegar, é possível perceber como as mães tendem a ser parecidas umas com
as outras, enquanto os pais seguem um padrão mais errático de comportamento,
variando do envolvimento absoluto à mal disfarçada indiferença.
Mães de
primeira viagem costumam ser muito pragmáticas – e previsíveis. Não que o lado
subjetivo da maternidade não cobre algum reordenamento mental, mas são tantas as
questões práticas a enfrentar naquelas primeiras semanas – alimentar, aquecer,
aninhar –, que o resto parece ficar em segundo plano. O pai, por sua vez, é
sempre uma revelação, um mistério a ser decifrado na medida em que a nova
condição se impõe.
A forma como um homem lida com a paternidade é uma
espécie de consolidação de uma mistura imponderável de uma série de variáveis,
que vão da ideia de pai ideal que ele construiu ao longo da vida (ou não) ao
investimento amoroso na mulher que está lhe dando um filho. Há pais quase mães,
assim como há pais quase tios de segundo grau. Ambos orbitam no âmbito da
“normalidade”, ou seja, um pai que nunca trocou uma fralda pode ser tão
aceitável (ou estranho) quanto um pai que parou de trabalhar para cuidar do
filho.
Nos casos de uma paternidade não desejada, ao homem é dada a
opção de decidir se será um pai de fato ou de dever, já que a lei obriga que
pague as contas de um filho comprovadamente seu – mas não mais do que isso. Em
um país com uma arraigada cultura de abandono de filhos, o teste de DNA foi um
avanço e tanto.
São tantas as histórias de pais que somem deixando para trás filhos nascidos dentro ou fora de um casamento, que é impossível a gente não se perguntar por que isso é tão comum aqui e não tanto em outros países com condições sociais e econômicas parecidas com as nossas.
Curiosamente, o
mesmo país que naturalizou o “pai desconhecido” não quer nem ouvir falar em uma
legislação que contemple a interrupção de uma gravidez indesejada. Na prática, a
ambígua moralidade brasileira dá o seguinte recado para o mundo: mulheres têm a
obrigação de ser mães, querendo ou não, enquanto os homens têm apenas o dever de
pagar as contas – e isso se a lei os alcançar.
A decisão inédita do STJ
de condenar um pai por “abandono afetivo” da filha, anunciada esta semana, abre
a possibilidade de discutirmos as letras miúdas do contrato de paternidade. Pais
podem dar bronca ou não, podem ensinar o filho a andar de bicicleta ou não,
podem sustentar a família ou não. A paternidade ideal, ou possível, sempre será
uma construção individual, tanto quanto a maternidade. Mas os compromissos de um
pai ou de uma mãe com um filho nunca vão ser apenas materiais. Como lembrou a
ministra Nancy Andrighi ao dar sentença esta semana, “amar é faculdade, cuidar é
dever”.
Zero Hora
05/05/2012
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