Estou envelhecendo...Encerrei mais uma etapa de minha vida. Ministrei minha última aula na UFSM, por coincidência na mesma sala onde comecei a minha formação acadêmica. No ano de 1979 fui apresentada ao mundo do Direito por uma equipe de profissionais altamente qualificada. Passei cinco anos naquele prédio convivendo com uma turma unida e dedicada. Minha geração foi a fundadora do Diretório Livre do Direito e a que sofreu a primeira experiência de greve dos docentes universitários. Vivi o retorno da democracia no Brasil: lembro da vinda do sindicalista Lula como palestrante em Santa Maria, acompanhei com meus colegas o retorno dos exilados políticos, o episódio da Guerra das Malvinas, o atentado do Riocenter, os primeiros passos para a nova constituição e o movimento pelas eleições diretas. Eram tempos difíceis, os jovens estavam confusos e ainda havia muita desconfiança no mundo acadêmico. Mas tínhamos muita esperança na busca de um novo Brasil. Nossa formatura foi em 1983. Um momento de muita emoção, onde a alegria da conquista se misturava com a tristeza da separação e o medo do futuro.
Retornei à instituição em 1994, desta vez como professora, quando ainda reencontrei alguns dos meus mestres, estranhamente agora meus colegas. Pouca coisa havia mudado no curso de Direito: a mesma estrutura, o mesmo currículo, as mesmas obras na biblioteca, porém a qualificação dos alunos passou a ser muito maior, por conta da concorrência na seleção: chega a atingir a proporção de 28 candidatos por vaga no vestibular. Em virtude desses méritos, o Curso já recebeu várias distinções pelo rendimento de seus egressos nos concursos públicos. Assim, foi um grande privilégio e um desafio trabalhar com esses acadêmicos. Sempre lembrarei com carinho das expressões e olhares atentos nas aulas expositivas; das perguntas inteligentes e instigantes que muitas vezes provocaram meu comprometimento para novas pesquisas; da participação e qualidade nos seminários e trabalhos solicitados... Nesses dezesseis anos de atuação docente na UFSM, passei grande parte como orientadora do estágio. Na “Assistência”, como carinhosamente chamamos o Núcleo de Prática Jurídica, assisti a vontade de fazer justiça por parte desses jovens. O idealismo e a teoria posta em prática, muitas vezes com resultados que os decepcionavam. Lembro de um aluno fazendo “plantão” no gabinete de um secretário municipal, para protestar pela cobrança da expedição de uma certidão pública, já que a própria Constituição determinava a gratuidade (onde estará o “Kaiser” agora? Continuará com a mesma garra?). Lembro também de uma aluna levando pela mão uma pobre senhora idosa, até o prédio do INSS, para encaminhar um benefício previdenciário (a "Giana" continua lutando pela justiça social, agora como promotor pública). Muitos desses estagiários agora também são meus colegas docentes. Por coincidência, durante essa minha última aula, uma ex-cliente bateu na porta da sala, procurando informações sobre um precatório que sua mãe faz jus desde 1994: um dos primeiros processos em que atuei com os alunos, onde a velha senhora, que teve reconhecida judicialmente sua condição de pensionista como companheira do segurado, até o momento não conseguiu receber seus atrasados.
Encerrei minha aula tentando conter as lágrimas e lutando pela firmeza na voz. Acho que meus alunos não perceberam minha tristeza. Na sala dos professores não havia ninguém para eu me despedir. Nem o quadro de formatura da turma de 1983 está mais pendurado na parede do corredor. Estava velho demais e foi para um depósito. No seu lugar, painéis mais modernos, com fotografias coloridas de rostos jovens e felizes. De forma melancólica, terminei a minha história com a UFSM evitando o velho elevador e descendo lentamente pelas escadas: do quarto andar para a agitação da Rua Floriano Peixoto.
parabéns pela posentadoria, mas fiquei melancólica com o texto, eu que estou contando os dias para me aposentar...
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