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sábado, 24 de março de 2012

Regime de bens e o Minha Casa

A igualdade entre homem e mulher e a autonomia familiar são alguns dos princípios norteadores do Direito da Família. Além dos dispositivos constitucionais atinentes à matéria, o Código Civil determina a isonomia de direito e deveres dos cônjuges e, em seguida, proíbe a interferência de qualquer pessoa, de direito público ou privado, na comunhão de vida instituída pelo casamento ou pela união estável. Apesar disso, tanto o Estado quanto a própria sociedade devem proteger os chamados membros vulneráveis da família, como as crianças, os idosos e as mulheres. Este é o fundamento das legislações como a Lei Maria da Penha e os próprios estatutos do Idoso e da Criança e do Adolescente. A questão patrimonial entre o casal, por outro lado, sempre foi referida como exemplo de autonomia, já que seus efeitos são estabelecidos por livre escolha do regime de bens. Isso ocorre tanto no casamento quanto na união estável. A exceção é a imposição do regime de separação de bens para situações em que a lei identifica a necessidade de proteção, como no caso de nubentes maiores de 70 anos. A Medida Provisória nº 561/2012, editada recentemente pela presidente da República, determina que o título de propriedade do imóvel adquirido no programa Minha Casa Minha Vida, na constância da sociedade conjugal, será dado à mulher, independentemente do regime de bens aplicável, excetuados os casos que envolvam recursos do FGTS. O programa já havia normatizado que a família monoparental, chefiada pela figura feminina, teria privilégio no critério de escolha de beneficiados, bem como que o contrato seria feito em nome da mulher.Tais escolhas foram justificadas pelos dados estatísticos que a apontam como a guardiã da família. Porém, ao impor desigualdade de tratamento capaz de provocar enriquecimento indevido, além de contrariar as regras do regime escolhido livremente, generalizando uma regra para quaisquer tipos de situações familiares, a MP fere frontalmente princípios constitucionais. Atinge, ainda, a prática necessária que faz com que os julgadores analisem as questões na área de família de forma casuística e cuidadosa, muitas vezes apoiando-se em outras áreas para a tomada de decisão.O texto da MP provocou grande reação, não só entre juristas, mas também na população, que identificou a excessiva interferência do Estado na vida privada, presumindo situações de vulnerabilidade que poderão não existir. Melhor teria sido se a proposta fosse pela reserva do direito real de habitação aos filhos incapazes, beneficiando assim, por extensão, aquele genitor que detivesse a guarda dos mesmos, sem ferir o direito de propriedade.
*Advogada, professora e especialista em Direito de Família e Sucessões
BERNADETE S. DOS SANTOS*
Publicado no Diário de Santa Maria, 24 de março 2012

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